quarta-feira, 29 de junho de 2011

Saborear as tradições algarvias

Sempre que pensamos em Algarve, vem-nos à memória as praias, o sol, as bebidas frescas e, para quem vai em Agosto, um irritante e desconcertante trânsito veraneante.

Mas a verdade é que a costa é apenas parte de uma região imensa em que há mais terra que areia, e é pelo interior que andei a passear na demanda dos sabores regionais.

Lanço-me à estrada e, depois de alguns quilómetros da "125", apanho a já chamada estrada antiga para Lisboa. Depois de passar a bomba de gasolina da BP, na saudosa estrada nacional, (bomba que, para muitos da minha geração, era o prelúdio de mais alguns minutos para chegar ao "Algarve das praias"), viro no cruzamento que indica Messines e, ao chegar à rotunda que tem Messines à direita, viro à esquerda e ,alguns centos de metros após, vejo a placa que anuncia: Restaurante Mussiene.

Parque privativo com sombra debaixo da latada, esplanada montada, mas a minha opção recai no interior - o calor do dia obriga ao aconchego fresco do ar condicionado, mas, com o fresco das estrelas, este promete ser um local mais apetecível e romântico.

Lá dentro, a decoração simples, mas não chocante, é acolhedora, com alguns pormenores interessantes, como a garrafeira que ocupa a parede de fundo, um bar com várias garrafas expostas e uma sazonal exposição fotográfica. Hoje a artista era da terra e o tema são imagens locais.

Sento-me à mesa e inicio logo os meus trabalhos com uns carapaus alimados sobre umas migas, tapenade de azeitonas e tomate - boa combinação, apenas uma pequena distracção no alho, que por vezes se sobrepunha aos outros sabores.

A seguir, a espetada de polvo com batata de Aljezur - mais uma vez, tudo bem confecionado, havendo uma boa combinação entre o doce da batata e o salgado do polvo, dispensava a pimenta rosa fresca, mas acredito que muita gente gostará.

Numa combinação mais séria, veio o robalo com espargos verdes e batata sauté. Quando os produtos são bons, dificilmente se consegue estragar e, neste caso, até enalteceu as qualidades frescas do robalo à linha.

Ainda houve espaço para umas costeletas de borrego (carré) com um ratatui de legumes da região e fundo de carne! Carne rosada, saborosa e exactamente no ponto em que foi pedida - nada a apontar, a não ser uma salva de palmas.

Não sei como, mas ainda dei umas dentadas nas bochechas de porco preto com puré de batata e brócolos, carne macia bem confecionada, mais uma vez, sem remates negativos - talvez fosse importante cuidar um pouco mais a apresentação deste prato.

Terminei com duas sobremesas: um bolo quente de chocolate com gelado e coulis de frutos silvestres e uma pêra bêbada com cama de baunilha.

O primeiro estava demasiado doce e o chocolate era banal, não elevando nada para as memórias; a segunda já era o oposto: a pêra estava bem cozinhada os sabores fortes do vinho e da canela não abafavam o "doce" da pêra - pelo contrário, harmonizavam muito bem e a baunilha dava um toque exótico ao prato.

Fiquei fascinado com a cozinha simples do chefe David Coelho: sem grandes pretensões, honesta nos produtos, simples na apresentação (por vezes demasiado simples) e forte em tradições e aromas.

O Algarve e o seu interior ganham por ter locais como estes e, quem por lá passa, ganha uma recordação do que melhor a região tem para oferecer.

A boa comida por um bom preço, nunca se nega uma visita.

Detalhes
Restaurante Mussiene
Monte de São José
8375-052
São Bartolomeu de Messines
N 37º14'52.9, W 8º17'04.98
+351 282 339 357 / 918 831 456
mussiene.restaurante@gmail.com
Horário: Terça a Domingo 12h00 às 15h00 e das 19h30 às 22h30 Preço médio: €25 Tipo de Cozinha: Regional Algarvia Contemporânea
Cartões: Todos

Texto publicado originalmente no Lifestyle do diário OJE a 29 de Junho de 2011

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